Route 66

Lucas Ventura
3 min readApr 18, 2022

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Esses dias eu me peguei pensando sobre o tempo e como o utilizamos. Sim, o tempo não é um inimigo, mas sim um amigo útil, se bem aproveitado.

Ao olhar em minha volta percebo que a vida se tornou uma corrida desesperada contra o tempo. O lazer; uma conversa com um amigo querido; sentar-se e brincar com uma criança apenas pelo prazer de sua risada gostosa; tomar um café demorado com os familiares ou com os amigos; deixar todas as interações das redes sociais de lado para andar pelo parque ou em volta de uma lagoa sem se preocupar com o tempo. Tudo isso é perda de tempo, dizem os modernos. O tempo é uma preocupação. Quando sobrar um tempinho, quem sabe.

Parece que tudo virou alvo de produção. Se tal atividade não for produtiva, não vale. Bobagem. Existe coisa mais produtiva do que deixar a bondade criacional tocar nossos rostos? Não há o que pague uma boa prosa com um bom café.

A vida não é sobre a velocidade da rota, é sobre o desfrutar da rota.

Ultimamente estou tendo a oportunidade de conhecer várias cidades do interior de Minas Gerais, e como é interessante observar a necessidade de reduzir marchas ao chegar nesses lugares tão acolhedores. As vias rápidas das capitais dão lugar às ruas interioranas. Os cumprimentos ligeiros da correria da grande metrópole não existem no campo, encontrar ou conhecer alguém é sempre um convite a conversas delongadas e prazerosas.

Talvez tenhamos perdido o tato da vida. Não a valorizamos como deveríamos. O tempo se apresenta como um inimigo porque queremos fazer tudo em um período considerado curto de vida. Mas será que a vida é curta mesmo ou nós que não aproveitamos o tempo devidamente?

Uma das minhas animações favoritas é Carros, pois já me ensinou lições valiosas. Uma delas é quando a Sally conta para McQueen como foi o passado de Radiator Springs. Ao vislumbrarem a cidade do alto (contendo as ruas com longas curvas de um lado e a interestadual do outro), os dois começam um diálogo muito interessante (com uma trilha sonora tão boa quanto a conversa).

McQueen: Olha, olha só. Eles estão dirigindo ali e nem sabem o que estão perdendo.

Sally: Antigamente não era assim. Há 40 anos aquela interestadual não existia. Naquela época os carros atravessavam o país de um jeito diferente. As estradas não eram retas como essa interestadual, acompanhavam as terras com suas subidas, descidas, curvas. Os carros não dirigiam nelas para ganhar tempo, dirigiam nelas para aproveitar o tempo.

É certo que a vida tem seu tempo determinado, não dá para vivê-la como que se fosse eterna aqui na terra. O desgaste e as rugas nos lembram disso constantemente. Por isso é necessário refletir se vale a pena pegar a Interstate 40 ou a Route 66. A vida não é sobre chegar mais rápido no fim, mas sobre usufruir da paisagem que o trajeto oferece.

Creio que tem momentos que a Interestadual é muito útil e válida, mas o processo da vida não se reduz a isso, a Rota alternativa é um caminho para aqueles que se esquecem que a vida é feita de subidas, descidas e curvas. Reduza as marchas, abra as janelas, coloque o braço para fora e deixe as maravilhas desta vida tocar seu rosto. Viva, não para poupar tempo, mas para se deliciar com o tempo.

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